Considera que o preço a pagar pelo confinamento foi justificado?
Fizemos o que era preciso fazer. Travámos a fundo e decidimos que a regra era ficar em casa, fechar o comércio, os restaurantes, os bares, etc. Os números e a matriz da situação sanitária dão-nos razão. As simulações efetuadas pela Research Luxembourg mostram que se não tivéssemos tomado todas aquelas medidas o impacto seria muito maior. Fizemos passar a saúde à frente da economia e enquanto ministro da Economia não me arrependo. Penso que tomamos a decisão certa no momento certo.
Se houver uma segunda vaga, a abordagem será a mesma?
Não faremos aquilo que fizemos em março. Neste momento já dispomos de muito mais informação sobre o vírus, conhecemos os gestos barreira e como devemos organizar os espaços. Nessa eventualidade teremos uma reação muito mais cirúrgica e subtil.
Há setores que só agora começam a sentir os efeitos do confinamento. Quais são os setores mais afetados?
Os setores em que a pandemia teve mais impacto são os ligados ao turismo, à construção, ao comércio, à restauração, aos eventos, estes sentiram efeitos mais imediatos. Alguns começam agora a retomar a atividade, mas com um volume de negócios muito abaixo do habitual. Depois há o setor da indústria que vai sofrer com a perda de vitalidade do mercado automóvel, da construção, dos produtores de materiais como o vidro, o aço, e o cimento que foram impactados pela desaceleração geral no Luxemburgo e na Europa.
Qual vai ser o impacto no Luxemburgo?
Somos uma pequena economia extremamente aberta. É evidente que sentimos rapidamente os efeitos desta queda da conjuntura. O que nos ajudou bastante foi o setor financeiro e o setor terciário que trabalharam normalmente, com algum desacelaramento, mas muito menos do que os outros setores da economia. Nestes setores, quase todos puderam trabalhar em teletrabalho e a atividade manteve-se. Isso permitiu-nos, proporcionalmente, em comparação a outros países, ser menos impactados. De acordo com as previsões do Statec, da Comissão Europeia, da OCDE e do FMI vamos ser menos afetados que outros países da Zona Euro.
Prevê uma retoma rápida?
O Statec prevê uma recessão de 6% este ano, com uma recuperação rápida em 2021, graças a um crescimento do PIB de 7%. Isto revela que esta é uma crise económica provocada por um confinamento brutal que parou tudo. Mas a dada altura “a máquina” tem de voltar a funcionar, com uma atividade que, em certos setores, não vai voltar aos níveis anteriores à crise.
Está otimista em relação a um acordo que permita à Europa sobreviver à crise?
Estou otimista porque estamos a ver avanços na mutualização da dívida e uma certa solidariedade, que resulta de uma tomada de consciência que não podemos avançar se não levarmos essa solidariedade aos países e regiões mais duramente afetados pela crise económica. Isso implica uma reforma da UE. É a única forma de reforçar a Europa face às outras grandes potências e de garantir o bem-estar e a riqueza em todo o continente de forma sustentável.
É um processo delicado e difícil. Há países que travam a fundo e outros que querem andar mais depressa. Mas estou otimista que vamos na boa direção, porque compreendemos o que temos a fazer: o relançamento da economia através do “Green New Deal”, da digitalização, de um investimento na saúde, na reindustrialização da Europa. Todas essas questões estão a ser discutidas a diferentes níveis, no Conselho Europeu, no Conselho de ministros das Finanças. Nunca será o ideal, mas são avanços que geram muita esperança. Estou otimista.
Prolongaram por mais um mês o plano de apoio às empresas e trabalhadores independentes. Será suficiente para evitar que dezenas de empresas entrem em falência?
O Plano de Estabilização, com 40 medidas e um pacote que mobiliza cerca de 11 mil milhões de euros, adotado em março, é imenso e não tem paralelo na Europa. Inclui um envelope de 800 milhões para sectores como o comércio, a horesca e o turismo. Injetamos muita liquidez nas empresas através de diversos instrumentos, através de ajudas diretas, mas também ao atrasar os pagamentos fiscais, da segurança social e de avanços reembolsáveis. Penso que pode permitir às empresas ultrapassarem esta fase difícil. Não há razão para que a atividade económica não retome, mas sem o vigor que conhecemos que no passado.
Muitas empresas adotaram um modelo misto entre o escritório e o teletrabalho. Como é que vê essa nova forma de trabalhar?
Uma das experiências mais interessantes deste período foi o teste à capacidade de trabalhar à distância. Em poucas semanas todos passaram ao teletrabalho. Inicialmente, provocou um choque no sistema e nas infraestruturas. A rede da Post e de telecomunicações foi três vezes mais solicitado do que é habitual. Mas, de uma forma geral, correu tudo bem. Isso demonstra que os investimentos feitos pela Post nos últimos anos foram importantes.
Quais são os benefícios e as desvantagens deste sistema e qual será o impacto para a economia?
Há muitos efeitos benéficos que resultam do teletrabalho e temos sem dúvida de encontrar um equilíbrio. Para já, há muitos empregos que não podem ser feitos em teletrabalho, como fazer pão ou servir nos restaurantes. Mas temos outros que funcionam muito bem.
Acho que devemos encontrar um equilíbrio e prever quantos dias por semana poderemos recorrer a esse sistema. Trabalhar dois dias por semana em casa e três no escritório para efetuar reuniões e interagir com os colegas, parece-me um modelo interessante. Sabemos que há obstáculos em termos regulamentares e fiscais que é necessário resolver. Há também certos efeitos negativos como os restaurantes em Kirchberg que são afetados pela ausência de clientes. Mas penso que quando as pessoas regressarem aos locais de trabalho, as coisas vão voltar à normalidade. Mas penso que o teletrabalho é algo que irá manter-se e tornar-se mais importante no futuro. Mas com equilíbrio.
O teletrabalho atenuou um dos problemas crónicos do país: a mobilidade. O Governo vai intervir para promover esse modo de trabalho?
Penso que efetivamente houve esse efeito. A covid-19 forçou-nos a uma experiência de teletrabalho e concluímos que funciona. Houve um momento em que não havia ninguém nas ruas e o problema do trânsito ficou completamente resolvido. Penso que os efeitos benéficos na redução do tráfego, da poluição e do stress das pessoas que passam duas a três horas no trânsito é evidente.
Há que encontrar um bom equilíbrio que seja um modelo interessante para o futuro. Principalmente para um país como o Luxemburgo com cerca de 200 mil transfronteiriços que vem trabalhar para o país todos os dias.
Nada voltará a ser como antes?
Penso que não. Já há consultores e advogados no estrangeiro que estão a pensar diminuir as suas superfícies de escritórios e isso terá um impacto também no imobiliário de escritórios. Talvez possa ter um efeito benéfico na oferta do mercado residencial. Penso que é algo que veio para ficar e que vai mudar a forma como trabalhamos e funcionamos. Mesmo na indústria o teletrabalho foi fortemente praticado durante o confinamento. Há muitas coisas que podemos fazer a partir de casa.
A presente crise pôs a descoberto a extrema dependência do Luxemburgo em setores críticos como o da saúde. A solução passa por reduzir essa dependência?
Tivemos momentos de stress no pico da crise em que pensamos: O que fazemos se o nosso pessoal da saúde não puder vir de França, da Alemanha ou da Bélgica? Felizmente encontramos soluções com os nossos vizinhos, mas nem sempre foi fácil.
Não estamos a pensar reduzir a dependência que temos em relação aos trabalhadores transfronteiriços. Temos necessidade dessa mão-de-obra que vem trabalhar para cá e gosta de o fazer. O que temos de fazer é assegurar que a Grande Região funciona de forma a resolver todos os problemas de tráfego, infraestruturas e de coexistência e que a Europa funcione em pleno mesmo nestas situações de pandemia.